Como é dito em Salvador: "sexta-feira é dia de (vestir) branco" |
Quando o capitão de Mar e Guerra Theodózio Rodrigues de Faria trouxe para Salvador, em 1745, a imagem do Cristo crucificado sob a invocação de Nosso Senhor do Bonfim, não imaginaria, àquela época, a importância que a devoção teria em pleno século XXI.
Nesta sexta-feira, 26 de dezembro, a última do ano de 2014, mais uma vez a fé do povo baiano (e também dos turistas) se repete. E foi demonstrada pelos milhares de pessoas, boa parte vestindo branco, que estiveram na Colina Sagrada, no bairro do Bonfim (Cidade Baixa) para celebrar e agradecer as bênçãos obtidas no ano que acaba e rezar pelo que está prestes a começar, na igreja mais famosa da Bahia.
Altar principal para onde todos os olhares se voltam logo ao entrar no templo |
A devoção no Brasil começa com a imagem histórica de 1745, que ocupa o altar principal, é similar à uma existente no santuário de Setúbal, em Portugal. Conta a história que tripulantes de um navio comandando por Faria - também batizado com o nome de Setúbal - que partira de Salvador com destino a Lisboa em final de 1742, passara por uma terrível tempestade. Temerosos em morrer, os marinheiros rezaram muito a bordo pedindo a salvação.
Ao chegar em Lisboa, após serem dados como desaparecidos, creditaram o milagre ao Senhor da Boa Morte, do Bonfim. Já dono de fazenda na região do Dique do Tororó, o Capitão Theodózio cumpriu uma promessa feita durante aquela terrível viagem e quando voltou a Salvador trouxe consigo a imagem e fundou a devoção.
Nosso Senhor do Bonfim da Bahia, imagem de 1745 |
Inicialmente a imagem foi colocada na Igreja de Nossa Senhora da Penha. A Igreja do Bonfim - construída com dinheiro do Capitão Theodózio e contribuições dos moradores da cidade - foi inaugurada em 24 de junho de 1754, e a imagem, já alvo de forte devoção, foi trasladada em procissão para o altar principal onde está até hoje.
Toda última sexta-feira do mês é celebrada pelos baianos na Colina Sagrada, mas a última sexta-feira do ano é sempre especial, marcada por diversas missas campais e bênçãos ministradas por sacerdotes que se revezavam nas áreas externas do templo.
Católicos fazem fila para receber bênção do padre e em seguida água benta |
Também são disponibilizados garrafões de água benta para a pessoa encher os recipientes que leva de casa. Quem preferir, pode comprar as garrafinhas já com a água por R$ 3. No interior do templo, onde também se podia ouvir pelos alto-falantes as celebrações e orações realizadas do lado de fora, outros fieis rezavam diante do altar principal do Senhor do Bonfim.
A igreja permaneceu lotada, mas as missas aconteceram do lado externo |
Na rua defronte à igreja, foi armado o altar para as missas campais, enquanto que na praça, o povo de santo, representado por ialorixás e babalorixás, davam banhos de folhas e rezavam os devotos do Candomblé, celebrando o pai dos orixás, Oxalá.
Na praça, em meio ao verde, devotos do Candomblé recebem banho de folhas |
Para os católicos, não faltou água benta. E para os turistas, as fitinhas para serem amarradas aos gradis com os pedidos, outra tradição bastante conhecida da famosa igreja.
O colorido das famosas fitinhas já fazem parte da imagem tradicional do Bonfim |
Não há registros de quando foi iniciada a tradição de amarrar as fitinhas aos gradis que separam o adro da igreja das escadarias, da rua e da praça. Já as fitinhas, antes chamadas de medidas, surgiram do costume dos primeiros romeiros (observe que ainda existem casas tradicionais dos visitantes no bairro), de encostar pedaços de pano à imagem e levar consigo como recordação.
Ao lado da igreja, o turista encontra barracas de lembranças, imagens e fitas |
Com o tempo, os pedaços de pano passaram a fitas que mediam o tamanho da imagem - daí serem chamadas de medidas do Bonfim - amarradas ao pulso com três nós e três pedidos, que seriam alcançados assim que as fitinhas partissem do pulso.
Hoje é difícil partir, já que não são mais feitas de cetim ou algodão como antigamente, mas de um material mais resistente. E passaram também a ser amarradas aos gradis, causando o belo efeito visual de cor em movimento que os turistas veem na entrada da igreja. Também são amarradas (com pedidos) a objetos sagrados, como a cruz da sala dos ex-votos.
Tradição da fitinha do Bonfim: em cada nó um pedido |
A Sala e Museu dos Ex-Votos são os locais de devoção que guardam toda sorte de objetos deixados pelos pagadores de promessas ao Senhor do Bonfim. São milhares de objetos e fotos.
Adicionar legenda |
Da cruz toda amarrada com as fitinhas a uma bomba desativada da II Guerra Mundial, há de tudo neste espaço. Em dias festivos, os visitantes têm acesso apenas à sala de ex-votos, localizada na lateral direita da igreja (para quem está de frente para o altar). Nos demais, a visita pode ser feita também ao museu, cujo ingresso custa R$ 3.
Fé, fitas coloridas, fotos e roupa branca: assim se resume o dia no Bonfim |
Outra atração que faz parte da visita ao Bonfim, e que deve permanecer até pelos menos o final do verão, são as imagens de cera em tamanho natural dos papas João Paulo II e Francisco. Elas podem ser vistas na lateral esquerda perto da entrada da Sala dos ex-Votos.
Imagens de cera em tamanho natural dos papas João Paulo II e Francisco |
Um aspecto interessante da visita ao Bonfim, é observar o fato de que o local escolhido para a construção do templo, uma colina, permitia que a igreja, reconhecida ao longe por suas torres, pudesse ser vista dos vários mirantes da cidade-fortaleza de Salvador e, principalmente, por quem chegava de navio ao porto da cidade. Da mesma forma, do alto do Bonfim pode-se ver, ao longe, a atual silhueta de prédios do Centro de Salvador até o Corredor da Vitória.
O outro lado da cidade (prédios e encosta da Vitória) visto do Bonfim |
Plano Inclinado Gonçalves: ao longe vislumbra-se as torres do Bonfim |
Nenhum comentário:
Postar um comentário